O seguinte aviso deveria acompanhar as caixas de DVD de Laranja Mecânica: caso for escrever uma resenha, critica ou trabalho acadêmico sobre esta obra, assista com bastante antecedência pois você precisará dispor de algum tempo para tentar entender o que viu. Aliás, provavelmente, todos os filmes de Kubrick deveriam trazer o texto acima em letras garrafais na capa. Mas, não há!
Got milk? |
Logo, aqui estou eu, tentando exprimir o que absorvi do filme em pouquíssimo tempo. O adolescente Alex (Malcolm McDowell) é o líder de uma gangue. Por diversão, ele e seus "druguis", espancam, saqueiam e estupram. Adeptos da "ultraviolência", como o próprio protagonista nos conta. Mas tudo que é bom dura pouco e logo Alex é traído por seus companheiros. Na prisão aceita participar de um "programa de reabilitação" em troca da redução de sua pena.
Primeiro, temos asco por Alex e sua violência, mas quando a "reabilitação" inicia fica difícil não sentir pena do complexo protagonista. O método, que promete eliminar os instintos violentos, na verdade priva suas cobaias do livre arbítrio, causando mal estar físico intenso ao presenciar violência. Eis aí o maior dos questionamentos do longa: ter como objetivo um "bem maior" (diminuir a criminalidade, e esvaziar as super-lotadas cadeias), a lavagem cerebral/tortura cometida pelo governo em seu novo programa deixa de ser violência?
É claro que Kubrick entrega este e outros questionamentos, em um roteiro bem elaborado, inteligente, sem pontas soltas e sem defender ou endossar a violência. É tarefa do expectador decidir o que é aceitavel, o que deve ser punido, quem merece uma segunda chance. E finalmente, se é possível mudar a natureza de um indivíduo, ou mesmo de uma sociedade.
Toda a técnica cinematográfica e o bom roteiro de Kubrick, no entanto, talvez não surtissem tanto efeito sem o elenco correto. E quando digo elenco, me refiro a Malcolm McDowell, único com tempo de tela suficiente para se destacar, uma vez que não um filme sobre personagens, mas sobre uma sociedade, tendo Alex como exemplo. O protagonista é gerador e vítima da violência e suas consequências. McDowell, se dedica às diversas fases do personagem com talento. Entregando o Alex predador, com mesma veracidade que energia que o Alex indefeso.
Isso tudo em um futuro fictício indeterminado, bastante parecido com o nosso presente. Ignorando o fato de ter sido lançado a mais de 4 décadas, o longa continua atual. E provavelmente, ainda não teve todas as suas possíveis interpretações desenvolvidas. Afinal, novas surgem a cada reprise. Eis aí mais um aviso que deveria vir na capa: é provável a necessidade de assistir diversas vezes, embora não isso não seja certeza de compreensão total.
Logo paro por aqui, mas não descarto a hipótese de uma futura atualização desta interpretação.
0 comentários:
Postar um comentário