Woody Allen dirige Mia Farrow: de vendedora de charutos a estrela do rádio |
Eu sempre achei que vida tinha que ter trilha sonora. Acho que de tanto ver filmes já tá entranhado em meu cérebro que determinada situação deveria ter tal trilha de fundo. Acho que todo cinéfilo já saiu chutando poça d'água na rua e cantarolando "I'm singing in the rain, just singin in the rain..." O quê? Não?! Só eu? Bom... Ao assistir A era do rádio (Radio Days, 1987) eu tenho mais certeza de que não sou só eu quem faz isso (isso mesmo, verbo no presente do indicativo. É mais forte que eu, não consigo evitar.).
O longa é gracioso, com fortes influências autobiográficas do diretor Woody Allen, que tem aquela cara de filme que mais parece uma conversa de bar. É como se o próprio Woddy estivesse contando, entre um café e um pão de queijo, as lembranças que ele tem - e o que vemos na tela é o que a gente imagina que teria acontecido. Me senti exatamente assim: acompanhando as memórias dele. Um menino judeu, pobre, fala de seu herói nerd no rádio, de como era importante e fascinante ter um aparelho como aquele em casa, os programas preferidos dos personagens refletem as personalidades deles... É muito gostoso de acompanhar. Lembranças específicas, como o dia em que conseguiu o beijo da menina de quem gostava ou o dia em que a professora substituta entra na sala de aula (e ele já a tinha visto dançando nua pela janela do apartamento), e outras mais genéricas, como quando o fato histórico da apavorante narração da falsa invasão alienígena (fato histórico, conhecido por meio mundo) estava relacionado a ele, ou de como era impossível não se lembrar do vizinho tranquilo que havia surtado ao escutar uma música - quem nunca se pegou lembrando de determinada situação ao ouvir determinada música? O filme cativa a gente exatamente por isso: é igualzinho na vida real.
Seth Green vive o pequeno Joe, provável alterego de Allen no filme |
Para incrementar, lembrar um pouquinho do glamour que era ser um artista da rádio, seja cantor ou ator, somos presenteados com casos de bastidores da indústria. Se hoje Hollywood é a menina dos olhos dos que aspiram a fama, nos anos 1940 e 1950 a rádio era o auge do poder, glamour e fama. E, claro, tinha suas fofocas também. E mesmo que de forma mais discreta, todo mundo queria saber o que se passavam nos bastidores. Um filme feito com carinho, um olhar romântico para uma época mais romântica e vista através dos olhos de uma criança. Aliás, foi uma surpresa pra mim reconhecer Seth Green no menino ruivinho. Ele é um desses atores 'semi-famosos' que eu curto ver na telinha. Todo o elenco parece entrar no clima de 'vamos fazer uma homenagem à uma infância feliz', e seus personagens - mesmo os mau caracteres - são fofos. Vemos de novo Diane Keaton, Diane Wiest e Mia Farrow, esta dando um show de interpretação como a desengonçada e, no fim, bem-sucedida aspirante ao sucesso Sally White. Não é novidade que o diretor trabalha com suas musas até que se apaixone novamente por outra musa, com quem vai trabalhar por outros tantos filmes. Mas aqui estão 3 das maiores inspiradoras dele numa só tacada. E todas estão ótimas - mesmo que Keaton só apareça brevemente, mas arrasando quando canta. Muito legal também é a participação de Denise Velmont cantando Tico-tico no fubá. Nossa pequena notável Carmen Miranda foi um sucesso estrondoso no rádio, inclusive no exterior. É bom a gente se lembrar disso de vez em quando, ver o quanto nossa diva tupiniquim é mal reconhecida por aqui e ter conscicência de que sua lembrança sobrevive de estereótipos.
O momento em que mais ri no filme inteiro: a incrível história da lenda do beisebol |
Por ter sido um filme leve, divertido, engraçado, feito com emoção, e por ter animado meu feriadão de convalescência (resfriado, por quê não me abandonas?), A era do rádio foi uma ótima experiência. Entrou pra minha listinha de favoritos por ter me deixado um sorriso no rosto por muito tempo depois de eu ter desligado a tv. E me lembra que, um dia, a rádio pode voltar a ter boa música tocando de novo. Quem sabe que músicas vão marcar nossos próximos capítulos?
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