A sequência inicial de O profissional nos faz crer que se trata de um filme de ação comum. Mas basta Natalie Portman entrar em cena para percebermos que há algo diferente. Em exemplares mais comuns do gênero, aquela menininha de 12 anos que fuma escondido na escada seria sequestrada e resgatada pelo herói num desfecho emocionante, mas a narrativa está bem distante de ser assim. Com o desenrolar da trama (e graças ao enorme talento daquela então promissora atriz mirim), entendemos que Mathilda pode até não dar nome ao longa (que no original se chama Léon), mas é a verdadeira protagonista da história.
Um desentendimento provocado pelo sumiço de drogas causa um massacre na família de Mathilda, que só sobrevive por obra do acaso. Numa cena emocionante e difícil para uma atriz tão jovem, ela escapa de ser descoberta pelos bandidos graças à ajuda de Léon (Jean Reno), até então apenas um desconhecido. Mas a partir do momento em que decide acolhê-la, o matador profissional não tem outra escolha a não ser tomar conta dela.
A relação pai e filha se estabelece aos trancos e barrancos, não só devido à profissão de Léon, mas também por causa de sua inabilidade de se aproximar de outras pessoas. Solitário e metódico, ele vê sua rotina mudar da noite para o dia e não sabe bem o que fazer com tamanha responsabilidade. Resta a ele passar seus conhecimentos a Mathilda, ávida para pegar em armas e agir como uma adulta. Ou melhor, como uma assassina profissional adulta. Seu desejo emerge da necessidade de vingança e de proteção, mas também de sua enorme devoção a seu protetor, que não enxerga como figura paterna, mas como seu companheiro.
Pode causar estranhamento esse comportamento quase sexualizado de uma menina tão jovem em relação a um homem mais velho, mas tudo é conduzido com bastante delicadeza por Luc Besson no filme. Os momentos em que a garota banca a Marilyn Monroe, pede um beijo e fala em primeira vez soam inocentes e divertidos. Ao mesmo tempo, não dá para duvidar da relação amorosa dos dois (com todas as complexas nuances que só Freud seria capaz de explicar), pelo tanto de cuidado, carinho e respeito entre eles.
Sim, o filme tem um vilão: Gary Oldman inspiradíssimo na pele de Stansfield, o responsável pela chacina na casa de Mathilda. Sua personalidade excêntrica e sádica, constantemente potencializada pelos efeitos da droga, é um prato cheio para o ator desfilar tiques quando necessário, mas também transmitir toda sua loucura só com o olhar. Como um contraponto, Jean Reno é contido em cena quase todo o tempo, o que só faz potencializar sua transformação ao longo da história. O confronto final entre os dois respeita a cartilha dos filmes de ação com certo grau de previsibilidade mas nos presenteia com um belíssimo plano, em câmera subjetiva, que diz muito sem precisar mostrar nada. Simples, eficaz e poético.
Mas o grande acerto de Besson foi mesmo apresentar ao mundo Natalie Portman. Em seu primeiro trabalho no cinema, num papel de tamanha importância, ela mostrou segurança e competência em cenas bastante complexas. Ela soube ser tanto a criança que desestabiliza a vida de um assassino solitário quanto a vítima de um massacre com desejo de vingança. Difícil imaginar esse filme sem ela.
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