Um elenco de peso, atuações impecáveis, uma estória densa e parte da História, cenários, fotografia e figurinos perfeitos. Crimes ocultos (Child 44, 2015) é um filmaço.
Já no letreiro inicial vem a deixa de onde o filme parte: "não há assassinatos no paraíso" era uma frase muito propagada na Rússia de Stalin, e como o ideal precisava ser perfeito para garantir que o que o governo fazia e dizia era o certo, quem pagava era justamente quem sofria: o povo. Um desses massacrados pelo ideal de perfeição, vivendo num orfanato, o adolescente fugiu de lá e procurou se alistar no exército assim que teve chance. Foi rebatizado ali como Leo (Tom Hardy, em ótima performance) e viveu em melhores condições, tendo uma boa reputação como um dos melhores investigadores. Sua missão era coletar informações e prender os acusados de traição.
As coisas começam a mudar quando ele se desentende com Vasily (Joel Kinnaman), um soldado de seu grupo. Ele, invejoso de seu status e sua vida praticamente perfeita, acaba por armar uma armadilha e se vingar dele: com uma confissão arrancada, um nome especia vai parar nas mãos do superior e este o designa a Leo. Ele agora deveria investigar sua esposa, Raissa (Noomi Rapace, excelente como sempre).
Enquanto isso, ele ainda precisa lidar com outra situação - e é daí que vem o nome original do filme e do livro que o originou. O filho de seu amigo Alexei (Fares Fares) foi encontrado morto próximo à ferrovia, mas sua morte precisava ser declarada como um acidente de trem. Tendo consciência de que o que estava dizendo a seu amigo era a maior mentira (e o próprio Alexei consciente de que o amigo lhe mentia para protegê-lo), Leo precisa enfrentar duas difíceis escolhas: investigar ou não o assassinato de seu afilhado? Denunciar ou não sua amada esposa?
Leo faz suas escolhas: para o bem do país, deixa de investigar o crime; para o bem de seu amor, que anuncia que está grávida, a inocenta (mesmo sem provas de que ela era culpada, inocentar um acusado em confissão cheirava à traição). Assim, ele é sentenciado a um rebaixamento e isolamento - vai (sobre)viver na distante cidade de Volkks, sob a guarda do Comandante (Gary Oldman, dispensa comentários).
Lá chegando, surge um novo corpo de garoto encontrado perto da ferrovia - como havia acontecido a Jora, seu afilhado. Temendo pela segurança de seu filho (ou pelo sentimento de culpa que o persegue), Leo resolve instigar o Comandante a investigar mais a fundo sobre o crime, alegando que já tinha visto algo parecido acontecer em Moscou. Pondo sua vida em risco, com a ajuda da esposa e do seu superior, ele resolve ir mais a fundo nas investigações. Mas Vasily parece não ter se esquecido de seu desafeto, mesmo ele estando tão longe...
É incrível como a estória se desenha na sua frente. A forma como o vilão é apresentado, sem rosto, a princípio, é uma boa analogia ao real vilão: o sistema político em si. Não se podia questionar a segurança que o Estado provinha ao povo, portanto os crimes não existiam. Era assim, e não havia como descordar. Viver sufocado por esse aparente bem estar é o real vilão do filme: o que levou Leo ao orfanato, o que propiciou o surgimento e longa duração dos crimes bárbaros do serial killer, a delação de amigos, a situção das mulheres... Tudo parece ter uma causa única, e as consequências são terríveis. Um primor de produção, um filme que faz a gente pensar e repensar muito, atuações brilhantes. Um filme obrigatório de 2015.
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