Descobrir o trabalho de um artista depois de tanto tempo tem dessas coisas: a minha primeira impressão de Cabaret foi o espanto de ver como Liza Minnelli era linda e talentosa. Nenhum resquício do rosto repleto de botox (que sugeria decadência) que conheci, muitos anos depois do musical de Bob Fosse. Sua presença em cena, seu carisma e sua performance como a excêntrica Sally Bowes me impressionaram de cara. E talvez isso tenha compensado por não ver um musical estilo Broadway como eu imaginava, com direito a coreografias elaboradas e sofisticadas.
A americana Sally sonha com o dia em que sua grande oportunidade chegará e ela se tornará uma grande estrela. Enquanto isso não acontece, ela ganha a vida como dançarina no cabaré Kit Kat, em Berlim, nos anos 30, e também como prostituta. Quem sabe, entre um encontro e outro, ela não conheça alguém com contatos que a possa colocar no elenco de um filme? Mas o que o destino reservou para ela, por enquanto, é o britânico Brian Roberts (Michael York), recém-chegado à Alemanha, que acaba dividindo apartamento com ela. Sem muito jeito com as mulheres, e até inseguro sobre sua sexualidade, ele se deixa envolver pela personalidade cativante e pouco convencional da bailarina.
A situação muda de figura quando Maximilian von Heune (Helmut Griem) surge na vida da protagonista, dando início a um inusitado triângulo amoroso. Rico, ele a conquista de pronto, com presentes caros promessas de viagens ao exterior. Curiosamente, o professor de inglês também é atraído para esse universo de interesses, apesar de todo o ciúme. Aos poucos, o sentimento dele em relação ao rival vai mudando, e não demora muito para o alemão conseguir seduzir um, depois o outro. Não é preciso dizer mais para perceber que a trama, que envolve ainda um aborto, é bastante ousada para a época. Mas o mais impressionante é a naturalidade com que assuntos polêmicos como esse são abordados.
A crítica, ao contrário, fica por conta da ascensão nazista na Alemanha pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial. Embora a questão política permaneça a maior parte do tempo como pano de fundo, as referências aos militares são sempre negativas, como no número musical em que o mestre de cerimônias do Kit Kat e suas dançarinas debocham dos soldados. Ou ainda na excelente sequência em que se encena um espancamento no palco, seguido de muitas risadas do público, enquanto um homem é espancado até a morte por oficiais nos bastidores. Espécie de ópio para o povo, o cabaré entretém enquanto a realidade oprime cada vez mais. Outra menção ao crescente clima de medo é o tenso relacionamento entre o pobretão Bobby (Gerd Vespermann) e a bela e rica Natalia (Marisa Berenson). Se no início o grande problema eram as dúvidas dela em relação às intenções dele (que eram as piores possíveis), depois passa a ser o fato de ela ser judia e ele, não.
Apesar da minha decepção ao ver Liza Minnelli mais cantando do que dançando, Cabaret tem alguns números de destaque, como "Mein herr" (com direito a bailarinos, coreografia e um figurino marcante) e "Maybe this time". Os outros, confesso que não me empolgaram tanto. Como atriz, no entanto, sua performance é irretocável: apesar do jeito louco e deslumbrado, Sally tem seu lado melancólico, conformista e pé no chão - complexa e contraditória como qualquer mortal. Já Joel Grey, como o mestre de cerimônias, rouba a cena muitas vezes: nunca de cara limpa, sem direito a um nome ou fala, mas cheio de personalidade ao subir no palco, ele é um dos grandes acertos do filme. Uma pena que não tenha sido o suficiente para me conquistar de vez. Acho que o filme não entra na lista dos meus favoritos, mas foi uma descoberta interessante.
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