Adoro quando Hollywood fala sobre Hollywood. Não só por curiosidade, já que, cada vez que isso acontece, os filmes mostram um pouquinho da história do cinema. Mas também, e principalmente, por causa da grande quantidade de ironia que acompanha histórias como a de Cantando na chuva. Vai dizer que a sequência inicial já não é demais? O grande Don Lockwood, agora um grande astro, contando seu glorioso começo na carreira, quando vemos que tudo não passa de um monte de mentiras. Ah, claro que biografias ficam muito mais charmosas quando certos detalhes são levemente melhorados, certo? O que vale no showbiz é mesmo a aparência.
E essa é só a primeira das muitas alfinetadas em estrelas com ego maior do que o talento, o peso que a publicidade tem na vida das pessoas, inventando até mesmo falsos relacionamentos, o preconceito do próprio meio para quem não é cria do teatro... Está tudo lá, muito bem costurado no ótimo roteiro. No número Make them laugh, a mensagem é ainda mais direta: "Você pode estudar e ser da elite, encantar os críticos e não ter nada para comer. Apenas escorregue numa casca de banana e terá o mundo a seus pés". Mas a melhor defesa do cinema, para mim, foi a sequência em que Don leva Kathy até o set e lhe mostra os truques fundamentais da sétima arte. É tudo mentira, sim, mas são só artifícios que garantem a magia do cinema. Lindo.
E os personagens não poderiam ser mais carismáticos. O primeiro diálogo de Don e Kathy, arrogante até o último fio de cabelo, é simplesmente delicioso. E já ali sentimos que os dois nasceram um para o outro. Não dá para torcer por um final diferente. Ainda mais quando descobrimos que, além de insuportável, Lina Lamont tem também uma hilária voz de pato rouco, e nem se dá conta disso. As cenas dela fazendo aulas com uma fonoaudióloga são divertidas, mas eu chorei de rir mesmo foi com O cavaleiro duelante, o filme dentro do filme. Ótima sacada mostrar o quão ridículo ficaria simplesmente colocar voz em um longa-metragem mudo, com aquelas atuações afetadas. Simples e muito eficiente. Ah, um parêntese: a sequência de Don e Lina trocando insultos enquanto simulavam uma cena romântica é ótima!
Não, eu não esqueci que se trata de um musical. É que, ao contrário de muitos exemplares do gênero, a história de Cantando na chuva é realmente boa. Mas os números de dança são espetaculares: Debbie Reynolds era graciosa, mas Gene Kelly e Donald O'Connor são de deixar qualquer um babando. Triste pensar que não temos mais atores/dançarinos assim hoje em dia. Mais um motivo para a gente rever este clássico um milhão de vezes. Coisa boa não envelhece.
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