Se existe um filme na franquia do qual eu não gosto é Harry Potter e o enigma do príncipe. Apressado, resumido demais, superficial. Reconheço que adaptar o sexto livro não era tarefa fácil. Com muito menos ação, o volume consistia, basicamente, em jogar uma luz em fatos passados que até então estavam obscuros (leia-se Tom Riddle) e fornecer informações que seriam importantes no desfecho da história. Ainda assim, umas alterações no roteiro cairiam muito bem. A começar por cortar algumas bobagens do início. Vejamos: a gente precisava ver o Harry paquerando a garçonete na lanchonete do metrô? E o prof. Horácio Slughorn (Jim Broadbent) transformado em uma poltrona antes de ser convidado para voltar a lecionar em Hogwarts? No livro, elas podem até funcionar, mas passagens como essas não fariam a menor falta no cinema.
A gente queria ver mesmo era os importantíssimos flashbacks que mostravam quem era Voldemort antes de virar o Lorde das Trevas que já conhecemos. Aliás, preciso dizer que os jovens Hero Fiennes Tiffin e Frank Dillane se saíram muito melhor que Christian Coulson (em A Câmara Secreta) na pele de Você-Sabe-Quem. O primeiro, visto ainda no orfanato durante a visita de Dumbledore, impressiona pela naturalidade. Ali, em cenas curtas, com poucas falas, dava para ver que ele não era um menino como os outros - não necessariamente mau, mas já com um pé no lado negro da força. Difícil conseguir passar tanta informação com tanta sutileza assim. Coisa de ator bom mesmo. Já Frank, numa interpretação um pouco mais afetada porém convincente (ele acha que ser cínico é apertar os olhinhos), demonstra que o bruxo cruel e ambicioso que Riddle viria a se tornar já estava tomando forma.
Outro ator que merece destaque é Tom Felton, que cresce em cena graças à grande virada de Draco Malfoy. Agora, o lourinho platinado da Sonserina não estava mais apenas fazendo bullying nos corredores de Hogwarts e fazendo jus à péssima educação que recebeu. A coisa ficou séria e tomou proporções que nem ele imaginava. Com uma missão recebida pelo próprio Voldemort, é a chance que ele tem de se sentir também "o escolhido", como ele mesmo diz, mas também é uma responsabilidade que pode condená-lo à morte se ele fracassar. Mas agora é muito tarde pra voltar atrás. Um bom dilema, que Yates conduziu bem no filme.
Aliviando um pouco essa tensão toda, Rupert Grint, que é sempre engraçado, provoca gargalhadas na hilária trama da poção do amor, que, ao mesmo tempo, é também uma passagem bastante sensível. Mesmo sem querer (e sem notar, meninos não são mesmo muito espertos), Rony acaba magoando Hermione profundamente ao se envolver com Lilá Brown (Jessie Cave). E é aí que Emma Watson, assim como sua personagem, mostra-se a vértice mais madura do trio principal: divertida quando tem que ser, emotiva quando o rumo da história pede. Já Daniel Radcliffe não é um grande ator, mas também não compromete neste momento em que Potter é obrigado a tomar decisões cada vez mais maduras e mais difíceis. É, os meninos cresceram!
Vocês reparam que até agora quase não falei do protagonista? Pois isso tem um motivo. Todo o mistério em torno do livro do Príncipe Mestiço, que Harry usa durante boa parte da história, não empolga e chega a ser frustrante. Além disso, tem tanta coisa mais importante acontecendo, que a gente perde o foco. Mas (e esse é um grande mas) o que é imperdoável é a falta de explicação para o que deveria ser o principal no livro: as horcruxes. Aí estava o segredo para matar Voldemort, a solução para todos os problemas! Faltavam muitas informações, mas esse era o ponto de partida. E isso passa tão batido quanto a gravidez da Tonks (Natalia Tena), por exemplo, que nem chega a ser anunciada. Aliás, alguém avisou para quem não leu o livro que ela e Lupin estavam juntos? Acho que seria de bom tom. Assim como informar de onde vieram o anel, o medalhão... Para que gastar tempo com bobagens e não explicar a razão de ser do livro?
Só que a grande decepção ainda estava por vir: a morte de Dumbledore. Mudando radicalmente esta passagem em relação ao texto original de J.K. Rowling, o filme perde muito em termos dramáticos. Quando os Comensais da Morte invagem Hogwarts, deveria haver uma intensa batalha entre eles, os professores e os membros da Ordem. Na versão cinematográfica, não sei se por economia de tempo ou de dinheiro, o grupo liderado por Belatriz chega através do armário sumidouro e vai direto à Torre de Astronomia, onde o diretor acaba de chegar da caverna dos inferi (parte da narrativa também roteirizada com extrema preguiça). Era óbvio que ele, extremamente fraco e desarmado por Draco, não tinha saída. Snape só concluiu o que a cena toda já havia anunciado com antecedência. Perdeu-se o fator surpresa, perdeu-se em emoção, perdeu-se em fidelidade. Mas a cena da garçonete está lá, inteirinha, para quem rever o filme duzentas vezes. Qual a importância dela mesmo, hein?
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