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Um anime de carne e osso


Uma das coisas boas de se assistir aos filmes de Quentin Tarantino é perceber o quanto ele se diverte fazendo filmes. Tanto quanto a gente se diverte com eles. E Kill Bill vol. 1 é uma produção com pedigree Tarantino em todos os níveis: no roteiro fragmentado, na incrível fotografia, nas descaradas referências aos filmes de kung fu e animes japoneses, na violência estilizada e no humor negro. Porque não há outra maneira de assistir a essa história em que a esguia e delicada Uma Thurman seja páreo para um exército de bem treinados guarda-costas da chefe do crime em Tóquio, certo?

Apesar disso, a breve e impactante cena de abertura não poderia ser mais trágica: A Noiva revela ao seu algoz que está esperando um filho dele, ao som da bela "Bang bang, my baby shot me down", na voz de Nancy Sinatra. O que aconteceu durante o casamento é um mistério (que só será revelado no vol. 2), mas a empatia com a protagonista já está garantida. E surpresa: sua vingança não só já está em prática - o filme começa pelo segundo item da lista -, como aquela mulher, aparentemente frágil, se mostra uma exímia e perigosa oponente.


Já neste primeiro capítulo chamam a atenção as cenas de luta muito bem coreografadas e ensaiadas pelos dublês. O trabalho é tão bom que Tarantino pode se dar ao luxo de filmar em planos mais abertos do que normalmente se faz, e o resultado é bem convincente. Mas o cuidado da direção de arte também é impressionante. No caso de Vernita Green (Vivica A. Fox), ex-integrante do Esquadrão das Víboras Assassinas e sua primeira vítima, os brinquedos na varanda indicam que ali mora uma pacata dona de casa e mãe de família. E é pela grande janela da sala que vemos o ônibus escolar se aproximando, criando o grande momento de tensão da sequência: a chegada da filha de Vernita. As ações e diálogos que se seguem são impagáveis.

No capítulo do esperado embate com O-ren Ishii (Lucy Liu), o clube onde ela se reúne com seus capangas enquanto acontece um show, é cheio de divisórias quase transparentes, o que permite a câmera se esgueirar por todos os cantos e seguir os passos dos personagens em todas as direções, inclusive em planos aéreos e outros ângulos inusitados. Sem falar na luminosidade do local, que garante belas tomadas como a do combate no contraluz. Outra decisão estética interessante foi contar a história de Ishii em forma de anime, uma declarada fonte de inspiração de Tarantino, e que funcionou muito bem, principalmente pela trama se passar no Japão. Mas a animação, naturalmente exagerada, tem também outra função: garantir unidade com o restante do filme, que reúne diversas cenas de cabeças cortadas e sangue esguichando por todos os lados. O tom, tanto no drama quanto na ação, é o mesmo nas cenas com atores de carne e osso.


Uma Thurman, que fez o dever de casa e, surpreendentemente, convence como heroína nas sequências de luta tanto quanto como a mocinha nos momentos mais dramáticos, merece aplausos. A hora em que ela desperta do coma é tocante ao extremo. Mas todo o elenco coadjuvante merece destaque, em especial Daryl Hannah como Elle Driver, que ganhou uma das sequências mais marcantes do filme.

A escolha por manter segredo sobre a figura de Bill e sobre o que realmente aconteceu durante o casamento foi uma decisão acertadíssima, porque garante a curiosidade do público pela continuação, acentuada pela surpreendente revelação final. Os breves flashbacks e as informações apenas pontuais do roteiro atiçam a imaginação dos espectadores, que querem completar esse quebra-cabeças o quanto antes. Cineasta competente, Tarantino consegue a proeza de nos entregar filmes bem feitos, mas não só isso: com seu estilo inconfundível e personalidade. E isso é pra poucos.

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