A sinopse de 8½ não é lá essas coisas: cineasta atormentado que não consegue ter uma ideia para o seu próximo filme. O que torna o longa de Fellini tão diferenciado é... Fellini. Quem já viu algum filme do diretor sabe que uma de suas características mais marcantes é seu gosto pelo clima onírico, pela força das memórias, por um apelo menos racional. E, sim, tudo isso pode ser muito confuso. Eu não sei vocês, mas acho mais fácil acompanhar os flashbacks, flashforwards e flashsides de Lost que embarcar nessa viagem pelo imaginário do diretor. É difícil, mas não deixa de ser um exercício interessante.
Primeiro, preciso explicar que eu fiz o caminho inverso de muita gente. Antes de ver o original, assisti à sua recente adaptação cinematográfica, Nine - na verdade, a versão para a telona de um musical da Broadway inspirado em 8½. E comparar as duas obras talvez me faça ver mais qualidades no longa italiano. Isso porque o filme de Rob Marshall consegue destruir toda e qualquer sutileza e (por que não?) poesia da história, juntando todos os ingredientes disponíveis na trama sem chegar a lugar algum. Interpretações, diálogos, músicas, tudo vira uma gororoba pra lá de indigesta (leia mais aqui).
Por tudo isso, não me aborreci ao ver o galã Marcello Mastroiani em cena na pele de Guido ou Anouk Aimée como Luisa, duas das interpretações mais impressionantes do filme. Aliás, o casal em crise é uma das poucas constantes do longa, que alterna inúmeras personagens (principalmente femininas) sem se prender a nenhuma nem se preocupar em explicar de onde elas vêm. Elas simplesmente giram em torno de Guido, sejam elas reais ou imaginárias. E se perder nesse meio é fácil, fácil, e, às vezes, irritante. Minha diversão era tentar achar a correspondente do filme americano: quem é a Fergie, a Nicole Kidman, a Penélope Cruz.
O que cansa é a duração do filme: 138 minutos de devaneios e delírios foi demais para mim. No mais, adorei as cenas sobre o filme propriamente dito: desde a atriz que fazia todos os testes possíveis mas não tinha ideia de qual seria seu papel até o momento em que Guido discute com seus produtores sobre alguns fiapos de ideias que surgiram depois de muito sofrimento. A resposta era algo do tipo: "Ninguém quer ver coisas que não entende!". Bota autobiográfico nisso, hein, seu Fellini? Provocação pura! Por ironia (ou vergonha da ignorância?), o ininteligível virou cult. Vai entender...
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