O desafio proposto por este blog - assistir a 50 filmes em um ano - já me reservou algumas surpresas, mas ouso dizer que O bandido da luz vermelha foi o filme que mais superou minhas expectativas até agora. Não que eu esperasse uma porcaria, mas sou obrigada a admitir minha completa ignorância em relação ao cinema nacional. Sou da geração da chamada retomada, que começou, se não me engano, com Central do Brasil, em 1998. E foi preciso uma indicação ao Oscar para os cineastas tupiniquins conquistarem o respeito do público brasileiro. O que foi produzido antes disso eu desconhecia. É um defeito grave para qualquer cinéfilo, eu sei, mas pretendo corrigir isso a partir de agora. E o clássico de Sganzerla é um ótimo ponto de partida.
Para começar, o filme tem 42 anos, mas corpinho de 20. Sério, não é aquele velho clichê do "ainda soa tão atual". O clima é de 1968, o que fica claro nos penteados armados das mulheres, nos carros conversíveis e na reação das pessoas ao que hoje chega a ser banal: Janete Jane (Helena Ignez) é tachada de "traficante de maconha" como se fosse o pior crime possível. Dá pra imaginar isso hoje em dia? Chega a ser engraçado, numa época em que o crack já deve estar até ultrapassado. Ou a descrição do perigoso Bandido da luz vermelha (Paulo Villaça): entre outras coisas, ficamos sabendo que ele é "dono de um imenso repertório de palavrões". Realmente, devia ser chocante.
Mas o que me impressionou mesmo foi a direção de Sganzerla. Sabe aquele papo de filme arrastado demais, que a gente costuma associar aos filmes mais antigos, especialmente os nacionais? Não se encaixa nesse caso. O filme, preto e branco, tem uma fotografia incrível, uma edição ágil, vários planos abertos e movimentos de câmera. Isso sem falar nos ótimos recursos do letreiro luminoso e da narração pseudojornalística que se repetem ao longo da projeção. Foge do óbvio e dá um efeito bem interessante à história, que, por si só, já é sensacional. E o mais impressionante é que o diretor tinha apenas 22 anos quando rodou o longa. Sinal de que a experiência pode até ser importante, mas cinema também precisa de frescor.
O bandido não se resume a uma cinebiografia tradicional, não condena nem absolve. Apenas mostra várias facetas de um personagem ambíguo, contraditório e intrigante. Ora chamado de "Zorro dos pobres" ou de "muito religioso", ele era também um criminoso da pior espécie: além de roubar, estuprava e matava suas vítimas sem clemência. E depois ia curtir, como se nada tivesse acontecido. Está tudo lá, mas sem recorrer aos manjados recursos de sempre. Ora, nem tudo está perdido...
1 comentários:
Momento, nerd: na verdade o primeiro filme da retomada a chamar atenção foi Carlota Joaquina (1995), de Carla Camurati e com Marieta Severo no papel título.
Quem disse que não aprendi nada fazendo monografia?
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