Assim caminha a humanidade é um filme ambicioso: em suas mais de três horas de duração, pretende contar não apenas a história da tradicional e importante família Benedict, como um pouco da história do próprio estado do Texas e discutir uma questão fundamental na cultura americana: o racismo. O que a grande maioria dos filmes ignora nesse relacionamento conflituoso entre a elite branca e os trabalhadores mexicanos é tratado abertamente, sem pudores. Difícil ver uma autocrítica tão corajosa. Mas triste é saber que ainda existe gente pensando daquele jeito.
Rock Hudson é Bick Benedict, um rico fazendeiro texano que logo se envolve com a bela Leslie (Elizabeth Taylor). Mesmo apaixonada, a jovem não abre mão de sua forte personalidade durante o casamento e chega a criar alguns conflitos com o marido por não tolerar o machismo (comportamento visto como natural naquele universo) nem o preconceito contra os latinos. Ao contrário, dona de um bom coração, faz de tudo para melhorar as condições de vida daquele povo, o que, a princípio não é visto com bons olhos por Bick.
Impressionante o carisma de Hudson, um galã perfeito, no papel do protagonista, um sujeito bem-intencionado, mas brutamontes e pouco esclarecido no que diz respeito à tolerância. Logo no início, causa um certo estranhamento quando ele repreende a mulher por ser apenas educada com os empregados. Mas durante o filme, vamos acompanhando seus passos até ver que, depois de muitos erros, aquele homem é capaz de evoluir. Graças, claro, à firmeza da esposa, que se manteve fiel aos seus princípios. Este é um belo trabalho de Liz Taylor, que consegue demarcar cada fase na vida da personagem com muito talento e sutileza: a menina petulante, a mulher recém-chegada a uma terra estranha decidida a ocupar o lugar que é seu de direito na casa do marido, a mãe de fibra e amorosa, a esposa dedicada sem ser submissa. É uma pena que um trabalho de composição como esse não é correspondido pela caracterização dos atores. Com o passar das décadas, os intérpretes ganham apenas cabelos brancos, permanecendo com o mesmo rosto que tinham quando eram jovens...
James Dean, em seu último trabalho no cinema, dá vida a Jett Rink, um antigo empregado dos Benedict que enriquece ao achar petróleo na terra em que ganhou de herança da ex-patroa. Naturalmente o antagonista, ele fica um pouco apagado diante das atuações dos colegas e da falta de ação do próprio personagem. Depois de tantas humilhações, o novo milionário poderia ter tentado mil coisas para conquistar Leslie, por quem sempre foi apaixonado, ou destruir seu principal rival. Mas nem dá para torcer muito por ele, que se mostra apenas uma pessoa rancorosa e orgulhosa, mas sem muita coragem e iniciativa.
O diretor George Stevens conduz muito bem o épico que tem em mãos, extraindo boas atuações do elenco e ainda nos brindando com uma edição ágil, na medida do possível, com muitos fades e elipses de tempo elegantes. Mas achei ousadia mesmo alguns planos inusitados envolvendo seus protagonistas. Na cena em que Brick está à mesa com a família de Leslie, por exemplo, no início do filme, é Liz Taylor que está em primeiro plano, mesmo não participando do diálogo. Em outro momento, quando Leslie sugere que os dois se afastem por um tempo para evitar mais desgaste no relacionamento, a atriz está com o rosto totalmente escondido pela penumbra. Mas uma das construções mais interessantes em termos dramatúrgicos é mesmo quando o casal, já maduro, conversa deitado na cama: Hudson em primeiro plano, falando sobre o destino dos filhos, e Elizabeth ofuscada pelo jornal. Só na metade do diálogo, quando ele abaixa o periódico, vemos que os dois já não dividem a mesma cama. Mesmo em um filme grande (no sentido literal e figurado), são esses detalhes que fazem o cinema ser cinema, e não apenas uma adaptação visual da literatura. São eles, afinal, que fazem toda a diferença.
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